Projeto de lei deve ser votado na Câmara
E-mail, correio eletrônico, mensagem… seja qual for a definição, o principal objetivo é comunicar-se. Com o avanço da informática e crescimento da internet, houve mudança nas relações sociais, relações essas que são regidas por normas, pelo Direito. Então, tentando seguir as transformações tecnológicas, deve ser votado até o final desta semana, na Câmara dos Deputados, um projeto de lei que pede a inclusão do e-mail como prova documental nos processos jurídicos, alterando o artigo número 375 da Lei número 5.869, de 11 de janeiro de 1973, do Código de Processo Civil (CPC).
Há cerca de um mês, um juiz da 29ª Vara Cível da Capital recebeu ameaças por e-mail. Através da quebra do sigilo telefônico, a polícia identificou que as mensagens partiram de linhas instaladas em dois escritórios de advocacia no Recife. Com autorização judicial, policiais do Grupo de Operações Especiais (GOE) da Polícia Civil apreenderam 44 computadores. As máquinas ainda estão sendo periciadas, segundo o delegado Derivaldo Falcão, que está presidindo o inquérito. Em investigações, por exemplo, a mensagem eletrônica serve como “indício e pode indicar o caminho a ser seguido”, destaca o delegado. No processo civil, o e-mail também pode constituir prova.
No entanto, o assunto vem sendo discutido pelos juristas, principalmente com relação ao processo civil, como pede o projeto. Muitos contestam a confiabilidade do e-mail, já que antes de chegar ao destinatário a mensagem percorre um longo caminho, podendo ter seu conteúdo alterado ou até mesmo ser interceptada por hackers, mas há quem defenda a necessidade da mudança.
A autora do projeto de lei, a deputada federal Sandra Rosado, do PSB, do Rio Grande do Norte, destaca que o computador tem desempenhado um importante papel, sobretudo no que se refere à comunicação, tendo a sociedade se tornado dependente da internet. “A intenção é dar mais celeridade, é facilitar os processos judiciais”, completa. Rosado diz que o CPC “não pode desprezar o e-mail como prova” e defende que o artigo 375, que “estabelece a presunção e autenticidade de telegramas, deveria prever a mesma prerrogativa para o e-mail”. No seu projeto de lei, a deputada coloca ainda que “não existe uma legislação que regulamente os serviços de e-mail eletrônico”.
Com relação à discussão sobre a confiabilidade do conteúdo, Sandra Rosado disse que sabia que o assunto iria gerar polêmica. “É até bom que se discuta. Mas qualquer documento pode ser alterado. Em alguns casos, se duvida até da assinatura pessoal e, nesse caso, são realizadas perícias. Hoje em dia, o e-mail já é um instrumento como o fax, por exemplo”, conclui. A deputada federal justifica ainda que o projeto pede apenas a alteração do CPC, porque o penal já adota outra conduta.
O projeto está na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados e a expectativa é que seja colocado em votação até o fim desta semana. De acordo com a deputada, como está tramitando em caráter conclusivo, sendo aprovada pela CCJC, a proposta segue direto para o Senado.
Especialistas questionam autenticidade das provas
Segundo especialistas em segurança de empresas na área de informática, a mensagem eletrônica pode, sim, ter seu conteúdo alterado. Além disso, uma pessoa pode se fazer passar por outra através do e-mail. Por essas razões, antes de aceitá-lo como prova documental, é preciso certificar a autoria e origem da mensagem.
Alfredo Gomes, gerente de canais da Trend Micro, coloca que é possível rastrear e certificar a legitimidade da autoria e do conteúdo mas, dificilmente o fraudador poderá ser identificado. Gomes ressalta que existe, por parte dos provedores, uma política de proteção, o que dificulta a identificação dos usuários. “No caso de empresas privadas, tudo fica mais fácil”, completa. Ele cita ainda um caso recente que ocorreu com o Orkut. “Criaram comunidades incentivando o tráfico e o consumo de drogas. A Polícia Federal pediu ao Google que liberasse a identificação dos criadores das comunidades e o pedido foi negado. O mesmo ocorre no caso dos e-mails gratuitos, por exemplo. Se o provedor for de fora do Brasil, isso fica ainda mais complicado”.
O especialista em segurança da Symantec, Lucio Costa de Almeida, ressaltou que para utilizar o e-mail como prova documental num processo jurídico é preciso contextualizar a situação. “A confiabilidade depende de quem está emitindo, do servidor, do sistema de segurança e de uma série de questões técnicas”, acrescenta. Lucio Costa de Almeida, também destaca que e-mail pode ser forjado ou o conteúdo da mensagem alterado e, como na maioria das brechas de segurança, os usuários domésticos são os mais vulneráveis. “Existem servidores que não têm uma política de segurança, o que facilita a criação de mensagens falsas. Por esse motivo, é necessário, antes de usá-las como prova cabal, realizar uma perícia técnica para comprovar todos esses aspectos”, alerta. O especialista coloca que, antes de incluir o e-mail como prova documental, é preciso criar uma legislação específica para os servidores nacionais e orientar usuários e empresas. “A partir de uma política unificada poderá ser possível usá-lo como prova”.
Juliana Andrade Lima